31 agosto 2005

Obituário

Por Luis Fernando Verissimo:

"Velhinha de Taubaté (1915-2005)"
"Morreu no último dia 19, aos 90 anos de idade, de causa ignorada, a paulista conhecida como ‘a Velhinha de Taubaté’, que se tornou uma celebridade nacional há alguns anos por ser a última pessoa no Brasil que ainda acreditava no governo. O fenômeno, que veio a público durante o governo Figueiredo, o último do ciclo dos generais, levou multidões a Taubaté e transformou a Velhinha numa das maiores atrações turísticas do estado. Além de estandes de tiro ao alvo e de venda de estatuetas da Velhinha e de uma roda-gigante, ergueram-se tendas para vender caldo de cana e pamonha em volta da pequena casa de madeira onde a Velhinha morava sozinha com seu gato, e não era raro a própria Velhinha sair de casa e oferecer seus bolinhos de polvilho a curiosos que chegavam em ônibus de excursão para serem fotografados com ela e pedirem seu autógrafo. A Velhinha sempre acompanhou a política e acreditou em todos os governos desde o de Getúlio Vargas, inclusive em todos os colaboradores dos governos militares, ‘até’, como costumavam dizer muitos na época, com espanto, ‘no Delfim Netto!’ O presidente Sarney telefonava freqüentemente para Taubaté para saber se a Velhinha, pelo menos, ainda acreditava nele, e Collor foi visitá-la mais de uma vez para pedir que ela não o deixasse só.
As circunstâncias da morte da Velhinha de Taubaté ainda não estão esclarecidas. Sua sobrinha Suzette, que tem uma agência de acompanhantes de congressistas em Brasília embora a Velhinha acreditasse que ela fazia trabalho social com religiosas, informou que a Velhinha já tivera um pequeno acidente vascular ao saber da compra de votos para a reeleição do Fernando Henrique Cardoso, em quem ela acreditava muito, mas ficara satisfeita com as explicações e se recuperara. Segundo Suzette, ela estava acompanhando as CPIs, comentara a sinceridade e o espírito público de todos os componentes das comissões, nenhum dos quais estava fazendo política, e de todos os depoentes, e acreditava que como todos estavam dizendo a verdade a crise acabaria logo, mas ultimamente começara a dar sinais de desânimo e, para grande surpresa da sobrinha, descrença. A Velhinha acreditara em Lula desde o começo e até rebatizara o seu gato, que agora se chamava Zé. Acreditava principalmente no Palocci. Ela morreu na frente da televisão, talvez com o choque de alguma notícia. Mas a polícia mandou os restos do chá que a Velhinha estava tomando com bolinhos de polvilho para exame de laboratório. Pode ter sido suicídio.
O ambiente no parque de diversão em torno da casa da Velhinha de Taubaté é de grande consternação."

30 agosto 2005

Será o começo?

Pra quem leu a resenha abaixo, do livro "Eu S/A", e mais ainda pra quem resolveu ler o livro (que, repito, vale mesmo a pena), olhem a notícia no caderno Cotidiano, da Folha de S. Paulo de hoje (para os assinantes da Folha, a matéria completa está no link que pode ser acessado clicando no título deste post):
"Serra libera anúncio em uniforme escolar
Patrocinadores viabilizariam a compra do kit para os alunos da rede pública municipal; proposta causa polêmica

O prefeito de São Paulo, José Serra (PSDB), decidiu permitir que os uniformes escolares da rede pública municipal de ensino tenham propagandas.Segundo a proposta, em troca da publicidade, as empresas vão bancar a compra das roupas dos 900 mil alunos beneficiados. O kit escolar incluirá agasalho, calça, meias e até roupa íntima, num total de nove peças.
A medida será viabilizada por meio de um acordo com a Abravest (Associação Brasileira do Vestuário), que irá procurar patrocinadores para os kits.
O coordenador da ONG Ação Educativa, Sérgio Haddad, afirmou que considera a idéia uma 'invasão do setor privado no espaço público'.
'A melhor maneira de as empresas ajudarem é pagando os seus impostos. Ou financiando projetos específicos. Alguém perguntou para as crianças?'".
E um trecho do livro:
"O professor anotou algo em sua pasta de papel. As escolas patrocinadas pelo McDonald's eram pão-duras. Nas escolas Pepsi todo mundo tinha notebook. E os uniformes eram muito melhores. Era difícil ser maneiro com os Arcos Dourados nas costas".
E então?

26 agosto 2005

Livro da Semana: Eu S/A

Instigante! Talvez amedrontador... Embora no final vire um romance policial sem maiores distinções, a idéia central desta obra é realmente fascinante.
A história se passa em um futuro próximo, no qual o capitalismo chegou praticamente ao seu ápice. Neste futuro, os sobrenomes das pessoas foram substituídos pelo nome das empresas para as quais trabalham. Quem não tem emprego, não tem sobrenome...!
O personagem central, Hack Nike, se vê em meio a uma estratégia revolucionária de marketing: para vender mais, e causar maior frisson entre seus clientes, a Nike decide matar um número determinado de clientes que comprarem seus novos tênis.
" -É bom ter você a bordo, Hack - O vice-presidente John Nike pegou o contrato, abriu uma gaveta e o largou lá dentro. - O que sabe sobre os Nike Mercury?
Hack piscou.
- É o nosso último produto. Não vi um par, mas... ouvi dizer que é fantástico.
- Começamos a vender os Mercury há seis meses. Sabe quantos pares já vendemos?
Hack balançou a cabeça. Cada par custava milhares de dólares, mas isso não impediria as pessoas de comprá-los.
(...)
- Mas Hack, se as pessoas perceberem que cada shopping tem os Mercury, vamos perder o prestígio que montamos. Estou certo?
- Está - Hack esperava parecer confiante.
- Sabe o que vamos fazer?
Ele balançou a cabeça.
- Vamos atirar neles - disse o vice-presidente John. - Vamos matar todos aqueles que comprarem um par. Não todo mundo, obviamente. Achamos que só temos de apagar... o que foi que decidimos? Cinco?
- Dez - disse o outro John."
Para os executivos, envoltos neste marketing de guerra, nada mais natural: no futuro próximo, o mundo inteiro (com exceção dos irredutíveis franceses) está privatizado e controlado por companhias americanas. As escolas também: elas levam o nome das empresas às quais pertencem: Mattel, McDonalds...
O governo só age se contratado para isso, ou seja, ele cobra para investigar crimes. Se a família não tiver dinheiro para pagar...
Nesse ambiente, a guerra entre as companhias está solta. E elas planejam o passo final -aniquilar o pouco que resta do Governo:
"Eu lhes dei um mundo sem interferência do Governo. Agora não existe campanha publicitária, nenhum trato entre empresas, nenhuma promoção, nenhuma coisa que vocês não possam fazer. Querem pagar para que crianças tatuem logotipos na testa? Quem vai impedir? Querem fazer computadores que precisem de conserto depois de três meses? Quem vai impedir? (...) Querem que a National Riffle Association os ajude a eliminar seus concorrentes? Então façam. Simplesmente façam".
Não deixa de ser instigante pensar num futuro destes. Para alguns, ele não está tão longe. Existem diversas obras que tratam dos horrores e dos possíveis horrores de sociedades comunistas. Esta vem para nos mostrar quão horrível pode ser também o outro lado da moeda...
Enfim, vale a pena ler esta obra. Um romance muito bem escrito, com este pano de fundo magistralmente bolado. Diversão garantida. E boa idéia pra um papo com os amigos depois.

Posted by Picasa Eu S/A - Autor Max Barry
Editora Record

24 agosto 2005

"Não há argumento para votar no PT"

Artigo do jornalista Clóvis Rossi, na Folha de S. Paulo:
"A primeira pergunta do auditório ao presidente interino do PT, Tarso Genro, durante a sabatina de que participou ontem, foi de uma menina de 17 anos que só queria argumentos que a convencessem a votar no PT no ano que vem.Genro, com uma franqueza corajosa e surpreendente, admitiu que não tinha um só argumento a oferecer. "Neste momento", ressalvou.
É o definitivo atestado de óbito de um partido. Se, há dois anos e meio, algum garoto/a pedisse argumentos a qualquer dirigente petista, ele se levantaria da cadeira, ofereceria a estrelinha vermelha ao jovem e levaria seu voto, mesmo que não acrescentasse um só argumento. O PT passou a vida vendendo sonhos. Entregou o mais nefando pesadelo em apenas dois anos e meio de governo.
É um caso de estudo para a ciência política universal. Já escrevi neste espaço uma e outra vez que o PT fez a mais radical e rápida guinada para a direita de que se tem notícia na história partidária do planeta.Agora, suicida-se a uma velocidade igualmente incomparável.
Genro bem que tentou, na sabatina de ontem, citar outros partidos de esquerda que foram vítimas de processo semelhante de esclerose múltipla e relativamente rápida (o PS italiano, o partido socialista espanhol), mas não há termo de comparação entre os problemas em que se envolveram lideranças desses partidos e o apodrecimento do PT.
Apodrecimento a olho nu, constatado não só pela oposição e por uma parcela importante da opinião pública, mas pelo próprio presidente interino do partido.
A única defesa, assim mesmo relativa do PT, está dada pelo fato, igualmente apontado pelo seu presidente interino, de que nenhum partido de esquerda foi até agora capaz de pôr de pé alguma coisa que faça sentido e seja diferente das políticas que o governo Lula implementou e são de um conservadorismo tão infernal que deixa sem argumentos até um dos poucos teóricos que restam no PT".

23 agosto 2005

Ladeira abaixo...

Pesquisa IBOPE, divulgada pelo Jornal Nacional de hoje. É a terceira pesquisa aplicada desde que estourou a crise política ora em curso, há praticamente 100 dias.

Aprovação de Lula
Caiu de 55% em junho para 45% agora. A desaprovação passou de 38% para 47%;

Confiança em Lula
Caiu de 53% para 43%. A falta de confiança subiu de 38% para 52%;

Principais responsáveis pela crise
PT, 29%; deputados federais, 28; Lula, 22%;

Se a eleição presidencial fosse hoje
Primeiro turno: Serra, 30%; Lula, 29 e Garotinho 10%;
Segundo turno: Serra, 44%; Lula, 35%;

22 agosto 2005

A tia Carmem deles...

Segurança máxima
Quando tinha de despachar suas moças para determinado endereço de Brasília muito visado pela imprensa, Jeany Mary Corner recorria a uma van com vidros dotados de insulfilm.

Fora do combinado
Em uma de suas negociações com Marcos Valério, Jeany Mary Corner enviou 15 moças para igual número de convidados a uma comemoração em Brasília. Já pelo fim da noite, Valério propôs uma troca geral de pares. As moças chiaram.

Lei do comércio
Diante da insistência dos clientes, as moças telefonaram para Jeany, que se abalou até o local para resolver a questão diretamente com Valério. "O senhor quando vai à loja e compra uma televisão por acaso leva duas? Então não vai ter troca coisa nenhuma." Não teve.

19 agosto 2005

Essas elites...

Parte de artigo da jornalista Eliane Cantanhêde, da Folha:

"O mestre-de-obras Jackson Inácio da Silva, 51, está bravo com um dos seus 15 irmãos, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
'Se meu pai fosse vivo, dava um tapa no pé da orelha dele, para ser mais vivo', declarou Jackson à repórter Mariana Campos, da Agência Folha, numa conversa em cima do telhado da casa em que está trabalhando.
'Falar que ele [o presidente] não sabia de nada é muita ingenuidade', opinou, dizendo que Lula 'tem uma vida' com Zé Dirceu, Genoino, Duda Mendonça e Delúbio Soares.
Recorrendo a uma metáfora bem ao gosto do irmão presidente, comparou: 'Uma namorada pode me trair um mês, mas, se ela me trair uma vida inteira, um dia eu vou saber'.
Pois é. Essas elites são assim mesmo, golpistas e cínicas, sempre se aproveitando de um momento de fragilidade do governo para criticar o Lula, que é nordestino, foi retirante, operário de fábrica e de esquerda.
Só porque a turma toda era unha e carne com ele, à exceção de Duda, que entrou na história depois de longa parceria com Maluf, já ficam imaginando por aí que o presidente sabia como as coisas vinham sendo feitas".

17 agosto 2005

Aleluia!

Se as eleições presidenciais fossem hoje, Lula perderia não apenas para o prefeito José Serra, mas também para o governador Geraldo Alckmin e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, os três aspirantes a candidato pelo PSDB em 2006.
A informação é do jornalista Ricardo Boechat, com base em dados da mais recente pesquisa do IBOPE que chegararam, hoje, ao conhecimento de Lula e de assessores dele. Boechat disse que não se sabe se a pesquisa será divulgada.
Serra abre 20 pontos percentuais de vantagem sobre Lula.

16 agosto 2005

"Nós" e "eles" - desmentidos

O Jornal Nacional de hoje transmitiu reportagem veiculada em Londres, que trata das apurações do assassinato do brasileiro Jean, cujo caso me referi na nota abaixo. De acordo com as investigações, vários fatos foram revistos:
1. O brasileiro não teria corrido dos policiais;
2. Ele não portava casaco pesado, e sim uma jaqueta jeans, como mostra foto do corpo no local do crime.
Ou seja, de fato ele não agiu como criminoso, como a imprensa até então dava indícios. Agiu normalmente, e o erro foi do policial que o teria seguido, o qual teria tido certeza tratar-se Jean de um terrorista procurado e já na mira da polícia.
Tais fatos me obrigam a estas correções, embora continuem todas as minhas afirmações sobre o tratamento conferido pela imprensa brasileira ao caso. Foi, como disse o Dedé, no comentário ao post abaixo, um absurdo. Mas absurdos ocorrem no mundo inteiro - e aqui no Brasil com especial ênfase - e a imprensa não adota o mesmo tom sensacionalista. Era isso.

"Nós" e "eles"....

Pra mudar um pouco o noticiário político, que tem tomado muito de nossa atenção, resolvi escrever sobre um assunto que já era merecedor de um comentário há algum tempo. De fato, eu já havia percebido, mas foi um e-mail de uma amiga que mora em Londres que me levou a refletir com mais intensidade.
Falo do assassinato do brasileiro Jean, em Londres, confundido com um terrorista e morto pela polícia londrina. No e-mail, ela já conclui, acertadamente: "Provavelmente a midia brasileira deve estar documentando com um sensacionalismo exagerado o que aconteceu com o brasileiro aqui em Londres". Pois é, nada como amigos inteligentes. De fato, desde a primeira notícia - e seu sensacionalismo - eu já tinha ficado com essa impressão. Algumas dúvidas iniciais me vieram. Primeiro, o fato de que a imprensa brasileira não confere tal caráter aos milhares de assassinatos cometidos aqui mesmo, no Brasil. De onde concluí: brasileiro matar brasileiro pode, mas se outro o fizer... aí a gente esperneia!
Quero deixar claro que não justifico o assassinato; ele não é justificável. Como também não o é a escandalosa e histérica cobertura que nossa imprensa realizou. E o enterro, na cidade do rapaz assassinado? Gente, teve ares de funeral de celebridade, ex-presidente, ídolos... Vocês viram a quantidade de gente que foi? Por favor, isso é um claro exagero.
Mas falando do assassinato em si, retratado por aqui como um absurdo cometido pela polícia inglesa: antes de tudo, é mister levar-se em conta que a situação na qual ele ocorreu não é uma situação de normalidade. É imprescindível se considerar que os ingleses estavam - e provavelmente ainda estão - sob os efeitos do choque dos atentados ocorridos havia poucos dias. Ou seja, não se vivia uma situação normal, rotineira.
Dado essa colocação inicial, a atitude do brasileiro não foi outra que não a atitude de um verdadeiro terrorista (com a triste, ou feliz, constatação um tanto tardia de que não o era). Vejamos: ele vestia um casacão, em pleno verão europeu. Se, em uma sociedade marcada pelo medo do terror recente, isso não é motivo claro para desconfiança, então não sei o que seria... Bom, mas isso só não seria suficiente. Pois não é que ele, ao ouvir ordem policial para parar, sai em disparada?! Ainda acham que não é motivo pra desconfiança séria? Em um lugar que havia sofrido um atendado terrorista não fazia nem uma semana? Bom, não contente, pra onde ele corre? Pra dentro do metrô (!!!), justamente onde havia ocorrido os atentados!! Pelo amor de Deus, qualquer ser humano munido de mais de uma dúzia de neurônios, e nas condições em questão, teria a mais plena certeza de que se tratava de um terrorista!
Bem, e o que fez a polícia londrina? Atirou para matar. E aí a imprensa brasileira fez mídia em cima do fato de terem sido tiros na cabeça. Pois bem, onde então queriam que um muito suposto terrorista - diria evidente, dadas suas atitudes - sofresse um tiro? No peito, local onde a bomba provavelmente estaria? Então melhor deixá-lo detoná-la sem atrapalhá-lo.... Na perna, dando mais do que tempo e condições para que ele mesmo acionasse a bomba? Não, pessoal, infelizmente só há um lugar pra se atirar em um terrorista, evitando o ataque, e esse lugar é na cabeça.
Infelizmente, estava tudo errado. Ele não era terrorista, não portava bomba nenhuma, e só fugiu porque tinha o visto vencido... Mas que agiu da forma exata, tal qual um terrorista, isso não tenho dúvida. É uma pena que tenhamos perdido a chance de analisar esta fatalidade por um ponto de vista mais inteligente, optando, ao invés disso, pelo tom histriônico e, desculpe, subdesenvolvido que sempre utilizamos ao retratarmos os assuntos quando "nós" somos prejudicados por "eles"...

Filmes que gostaríamos de ver - III


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Filmes que gostaríamos de ver - II


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15 agosto 2005

Filmes que gostaríamos de ver - I


Em cartaz em Brasília Posted by Picasa
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P.S. Note que no alto da página, a partir de agora, cada dia terá uma frase marcante. No momento, aquelas ligadas a política estão, obviamente, predominando!

Percam o medo e saiam às ruas

Pronto, gente. Quem ainda tinha medo, pode perdê-lo, lendo o comentário de Lúcia Hipólito, hoje, na CBN:


"Uma das principais preocupações dos leitores, no meio desta crise pavorosa, é com as hipóteses de sucessão do presidente Lula, na eventualidade ainda hoje remota de um processo de impeachment que resulte no afastamento do presidente.
Se isto um dia vier a acontecer, não há como não se afastar também o vice-presidente, que foi eleito junto com Lula. É diferente do caso de Fernando Collor, quando Itamar Franco não foi em nenhum momento associado com os casos de corrupção que envolveram o ex-presidente.
No Brasil de hoje, se ficar provado que a campanha eleitoral de 2002 foi paga com dinheiro de caixa dois, ou ainda se ficar provado que José Alencar sabia que o apoio de seu partido foi comprado pelo PT, como acusa o ex-deputado Valdemar Costa Neto, o vice-presidente será inevitavelmente arrastado no processo junto com o presidente Lula.
E aí, o pesadelo dos leitores – vamos falar claro – é a hipótese de a presidência da República cair no colo do deputado Severino Cavalcanti.
Mas este pesadelo não corre o menor risco de se tornar realidade. E quem afirma não sou eu, mas a Constituição brasileira. O artigo 80 declara que, em caso de vacância dos cargos de presidente e vice-presidente, serão chamados a exercer o cargo, primeiro o presidente da Câmara, depois o presidente do Senado e depois ainda o presidente do Supremo Tribunal Federal.
Muito bem. Mas o artigo seguinte, o 81, afirma com todas as letras que, se a vacância dos cargos de presidente e vice-presidente ocorrer nos dois últimos anos do mandato, serão convocadas eleições dentro de 30 dias.
Estas eleições serão indiretas. O presidente e o vice-presidente serão eleitos pelo Congresso Nacional e completarão o mandato.
Assim, na hipótese remota de Lula e José Alencar serem afastados como resultado de um processo de impeachment, o máximo que pode acontecer é o país ter Severino Cavalcanti como presidente da República por 30 dias.
Por mais criativo que seja, Severino não conseguirá tocar fogo no país nesse período. Ninguém precisa perder o sono por causa disso."

13 agosto 2005

O discurso de Lula

Editorial da Folha de São Paulo
"Foi pífio o tão aguardado pronunciamento do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O propalado discurso de estadista, que deveria servir para conter os ânimos exaltados pela crise política e pelas fartas evidências de corrupção, revelou-se uma peça frustrante.
Durante mais ou menos a metade de seu pronunciamento, o presidente da República, diante de seus ministros, perdeu-se em elogios a seu próprio governo. No restante, quando finalmente se dignou a falar da rede de desmandos em que se converteram sua administração e seu partido, ficou aquém das expectativas.
Com efeito, Lula afirmou-se indignado e traído, mas não disse por quem. Declarou que, se estivesse a seu alcance, já teria identificado e punido exemplarmente todos os responsáveis pela situação. Ora, sabe-se que o presidente fez o possível para manter na Casa Civil o ministro José Dirceu, que só caiu depois da patética advertência pública do deputado Roberto Jefferson. E o PT nem sequer expulsou de seus quadros o ex-tesoureiro Delúbio Soares, apontado como o principal operador do esquema de corrupção ao lado do publicitário Marcos Valério. Não se deve esquecer também que o governo encabeçado por Lula -que agora se proclama o mais indignado dos cidadãos- moveu todos os esforços para evitar a instalação das CPIs.
Embora o primeiro mandatário tenha dito que tem consciência da gravidade da crise, a sensação que transmitiu é a de que continua encapsulado num mundo à parte, onde o país vai muito bem, com exceção de desvios e problemas institucionais que prejudicam o sistema partidário.
Mesmo no momento que deveria ter sido o ponto alto do pronunciamento -o do pedido de desculpas-, mostrou-se acabrunhado. Tecnicamente, o presidente solicitou escusas à população, mas fê-lo cercando-se de tantos cuidados lingüísticos que transpareceu uma decisão tomada um tanto a contragosto.
De elogiável, ficou a decisão de quebrar a rotina de discursos populistas para se dirigir mais serenamente à nação. Embora tardio e pequeno, foi um passo positivo."

A desculpa que faltou

Clóvis Rossi, na Folha de S. Paulo:
"O pobre discurso do presidente da República acaba sendo apenas a confirmação do que já se vinha notando desde o início da crise: Luiz Inácio Lula da Silva é inepto como piloto de tormenta.
Como líderes são necessários, acima de tudo, nas horas de crise, Luiz Inácio Lula da Silva de certa forma demitiu-se ontem dessa função. Pode até permanecer na Presidência da República até o final do mandato, mas ficará como o que os norte-americanos adoram chamar de "lame duck" (literalmente, pato manco; no jargão político, um dirigente abalado, portanto manco).Líder que é líder e se acha traído dá o nome aos traidores, em vez de proteger o traidor pela ocultação.
Líder que é líder não diz que o governo deve desculpas ou que o PT deve desculpas, como se ele não fosse o líder de ambos e não devesse, portanto, dizer com todas as letras e a coragem que lhe faltou: "Eu peço desculpas". A primeira pessoa do singular era inescapável. O "nós" não a substitui, nas circunstâncias.Pedir desculpas para valer exigiria dizer que foi Lula, e ninguém mais, quem traiu a história de seu partido, certa ou errada.Lula sabia perfeitamente que comprar os serviços de Duda Mendonça é luxo que só poderia ser pago da forma como foi, ainda mais tendo como tesoureiro um certo Delúbio Soares, de plena confiança do presidente, outra omissão na desculpa.
Luiz Inácio Lula da Silva sabia perfeitamente que comprar o apoio do PL teria um preço não exatamente ético, como atesta agora o ex-presidente da legenda, o notório Valdemar Costa Neto. Fez questão de comprá-lo assim mesmo.
Luiz Inácio Lula da Silva sabia perfeitamente o preço para ter o apoio do PTB de Roberto Jefferson. Está pagando-o agora, na forma de uma crise muito maior que a sua aptidão para enfrentá-la."

12 agosto 2005

Crônica da morte

Do jornalista Ricardo Noblat:
"De uma forma ou de outra, o governo Lula acabou. Assim como os séculos não começam e nem terminam no dia fixado pelo calendário, os governos também não. São fatos cruciais que marcam a inauguração e o encerramento deles. O século passado começou com a 1a. Guerra Mundial e terminou com a ruina da União Soviética. Este começou em 11 de setembro de 2001.
A crônica da morte do governo Lula começou a ser escrita quando o presidente delegou funções que seriam suas aos ministros Palocci e José Dirceu, e preferiu sair pelo mundo a desfrutar da notoriedade recém-conquistada. Deslumbrou-se com o poder. Apreciou suas miçangas. E ao se comportar assim, revelou toda sua inaptidão para o exercício do cargo.
À falta de alternativa, Palocci teve o bom senso de tocar a política econômica que herdou. A conjuntura internacional favorável contribuiu para que o país voltasse a crescer. Dirceu foi engolido por seus próprios erros, defenestrado do poder e aguarda agora o momento de ser cassado. Os ditos programas sociais foram reduzidos ao mais escrachado assistencialismo.
Nem por isso o governo parecia condenado a se esgotar antes do tempo. E nem por isso Lula estava obrigado a abdicar do sonho de um novo mandato. E assim foi até que a lama represada e escondida das nossas vistas começou a emergir. Todos os pecados do governo e do próprio Lula seriam perdoados por aqueles que o elegeram - menos um: o pecado da corrupção.
Lula fingirá até o último dos seus dias que nada teve a ver com ele - mas teve, sim. Depois de disputar e de perder três eleições presidenciais, ele só se dispôs a concorrer pela quarta vez se o partido se rendesse completamente às suas condições. Elas traziam embutida o vírus da corrupção. Para vencer, Lula fez o que condenava nos adversários - e para governar, também.
Fracassou - e, de quebra, arrastou o PT com ele. Porque a arte de governar é mais complexa do que a arte de ganhar uma eleição. Porque não se governa como se ganha uma eleição. E porque ele jamais se preparou para governar. Não estava pronto, pois, para governar".

De tragédias...

Comentário de Lúcia Hipólito, na CBN:
"Foi a maior tragédia política da história deste país. Nunca antes se viu nada parecido. Deputados petistas chorando no plenário da Câmara, a senadora Ideli Salvati passando mal, o senador Aloísio Mercadante expondo seu espanto e, sobretudo, seu desencanto, senadores e deputados petistas na CPI dos Correios completamente atarantados diante da bomba atômica que o publicitário Duda Mendonça jogou no PT e no governo do presidente Lula.
Em depoimento-surpresa na CPI dos Correios, Duda Mendonça declarou, simplesmente e com todas as letras, que foi convidado para fazer um serviço, apresentou um orçamento que foi aprovado, prestou o serviço e, para conseguir receber todo o pagamento que lhe era devido, abriu uma conta no exterior e recebeu mais de dez milhões de reais, vindos de outras contas também no exterior.
Ou seja, o PT pagou parte da campanha eleitoral do presidente Lula, do senador Aloísio Mercadante, da candidata a governadora Benedita da Silva e do candidato a governador José Genoíno com dinheiro de caixa dois. De contas no exterior para uma conta de Duda Mendonça, também no exterior.
A Lei Orgânica dos partidos políticos proíbe os partidos brasileiros de lidarem com dinheiro de caixa 2 e contas no exterior. Esta prática é razão suficiente para o cancelamento do registro do partido no Tribunal Superior Eleitoral.
E é este o grave risco que corre o PT no momento: deixar de existir porque um grupo de dirigentes jogou o partido no escândalo de corrupção, compra de bancadas, extorsão, dinheiro de origem não-explicada, despesas e gastos pra lá de estranhos.
Dava pena ver o desalento do deputado José Eduardo Cardoso, do senador Mercadante, do deputado Osmar Fontana. Um deles fazia a pergunta que está na cabeça de todo mundo: como é que o partido vai se apresentar perante os militantes, aqueles que carregavam a bandeira do PT debaixo de sol, chuva e sereno?
Como é que o partido vai se desculpar diante da sociedade brasileira, por ter permitido que uma camarilha tenha tomado o Estado brasileiro de assalto e tenha provocado a maior crise política que este país já sofreu?
Curiosamente, não se ouviu um pio dos antigos dirigentes e líderes partidários. Por onde andam José Dirceu, José Genoíno, Delúbio Soares, João Paulo Cunha, Professor Luizinho, Paulo Rocha, Marta Suplicy? Ninguém sabe, ninguém viu.
Foi um dia muito triste. Tão triste, que nem a oposição mais assanhada se animou a comemorar. Pois não havia nada a festejar. Não se festeja uma tragédia."

A queda - Folha S. Paulo


Datafolha Posted by Picasa

Pesquisa eleição 2006 - Folha S. Paulo

Datafolha revela que, pela primeira vez, tucano bateria o petista no 2º turno; 46% são contra nova candidatura do presidente Apoio a Lula cai; Serra ganharia eleição

DA REPORTAGEM LOCAL
Pesquisa Datafolha realizada anteontem em todo o país revela, pela primeira vez, que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não seria reeleito se a disputa presidencial de 2006 fosse hoje.Lula perderia a Presidência em um segundo turno por uma margem considerável, de nove pontos percentuais, para o prefeito tucano de São Paulo, José Serra -derrotado pelo petista em 2002.Segundo a pesquisa, Lula e Serra chegariam empatados, dentro da margem de erro de dois pontos percentuais, ao primeiro turno. Lula com 30% e Serra com 27%.
No segundo turno, Serra avançaria, chegando ao dia da eleição com 48% das intenções de voto, contra 39% para Lula.
Em pesquisa anterior, realizada em 21 de julho, Lula estava à frente de Serra (45% a 41%). No limite da margem de erro, os dois estariam empatados, mas essa hipótese era considerada improvável.
Entre uma pesquisa e outra, Lula também perdeu quatro pontos percentuais no cenário contra Serra no primeiro turno.Serra é o único dos possíveis candidatos tucanos que poderia derrotar Lula no ano que vem, segundo o levantamento. Geraldo Alckmin, governador de São Paulo, perderia no segundo turno por 45% a 35%; e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, seria derrotado por 45% a 36%.Em um improvável segundo turno contra o ex-governador fluminense Anthony Garotinho, Lula venceria com uma margem de 46% a 32%.
A diferença entre Lula e seus principais prováveis adversários sofreu uma diminuição significativa em todos os cenários nos últimos 20 dias.Serra é também o único capaz de encostar em Lula no primeiro turno. Tanto Alckmin quanto FHC contam hoje com cerca da metade das intenções de voto depositadas em Lula. No caso de Garotinho, a diferença é ainda maior, de quase três vezes.Em meio a denúncias de corrupção contra seu governo e partido e com três CPIs em andamento no Congresso, Lula também atingiu a pior avaliação desde o início do mandato: 31% o consideram ótimo ou bom, uma queda de quatro pontos em relação à pesquisa feita 20 dias antes.
A pesquisa Datafolha, realizada na quarta-feira, 10 de agosto, ouviu 2.551 pessoas em 127 municípios de todos os Estados do país.
A pesquisa mostrou ainda que os brasileiros estão divididos quanto à hipótese de Lula tentar um novo mandato em 2006. Indagados se o petista deveria ou não se candidatar à reeleição em 2006, 50% aprovam a iniciativa, mas 46% acham que ele não deveria se candidatar.A maioria (75%), no entanto, acha que o presidente vai tentar a reeleição. Para 16%, o presidente não vai se candidatar.Para cerca de um terço dos entrevistados (31%), Lula é, entre os possíveis candidatos incluídos na pesquisa Datafolha, o que tem mais chance de vencer a disputa no ano que vem. Para 22%, Serra é que tem mais chance. Apostam em Alckmin 11%, em FHC 10% e em Garotinho 7%. No cenário eleitoral em que Lula teria Serra como principal adversário, os demais candidatos tiveram oscilações dentro da margem de erro da pesquisa. (FCZ)

Se a eleição presidencial fosse hoje...

A Folha de S. Paulo publica hoje mais uma rodada de pesquisa do Instituto Datafolha. A novidade: se a eleição presidencial fosse hoje, Lula e Serra disputariam o segundo turno. E Serra venceria.
Finalmente esse povo parece estar abrindo os olhos. Espero que comecem agora as manifestações nas ruas, porque não dá mais pra defender a permanência de Lula, como não deu para defender a de Collor em 1992.
Desde já, deixo claro aqui que sou favorável ao impeachment de Lula, pelo simples fato de que já está comprovado o assalto ao meu e ao seu dinheiro. E sobre a desculpa segundo a qual é perigoso deixar o país nas mãos de José Alencar, rebato: se nas mãos de Itamar Franco continuamos vivos, não vai ser um Alencar que vai nos derrubar!
Ao longo do dia, porei mais informações sobre a pesquisa da Folha.

10 agosto 2005

Grandeza de espírito

Igor Gielow, na Folha de S. Paulo de segunda-feira:
Grandeza de espírito

"Tal e qual um buraco negro, de onde nada escapa, nem a luz, a crise atual está tragando toda a classe política brasileira. O presidente Lula e seu governo que desapareceu são apenas as vítimas mais vistosas.Logicamente os políticos poderão contar com a enorme massa ignorante, que continuará votando por gravidade nesse ou naquele candidato. Valeriodutos, propinodutos e outros dutos seguirão, com maior ou menor grau de sofisticação, a irrigar campanhas, bolsos e cuecas.
Talvez isso garanta o show para 2006, mas é inescapável constatar que os políticos estão feridos de morte. É difícil imaginar qual discurso vai colar no ano que vem para os estratos mais esclarecidos da população que não têm interesses muito maiores que conseguir pagar as contas do fim do mês.
Os ricos, esses já estão satisfeitos: passaram sua lista de Natal para Lula na sexta. Atendidos, Lula pode se dizer Antônio Conselheiro encarnado, num desses discursos ensandecidos que faz, e tudo estará bem.
As opções não ajudam. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso praticamente pediu o impeachment de Lula ontem em "O Globo". Acusou-o, ao não aceitar sua "sugestão" de descartar a reeleição, de faltar com "grandeza de espírito".
FHC não tem autoridade para tais colocações. Passou oito anos ignorando quem as fazia. A diferença entre ele e Lula é que sua gestão política era superior à dos amadores do PT, então os escândalos eram melhor administrados -e abafados. Ou alguém aqui acha que os tucanos e pefelistas financiam suas campanhas vendendo camisetas?
O esquema atual só está sendo colocado a nu porque Lula não soube fazer política congressual. Como comparação, a articulação de FHC deixou sem respostas dúvidas gravíssimas sobre as privatizações.
Não que isso isente Lula. Nem de longe, e a lista de perguntas a responder é grande: empréstimos estranhos, dinheiro para Duda. Mas ajuda a criar uma perspectiva desoladora."

Código da máfia

Artigo de Fernando de Barros e Silva:
Lula e os picaretas do PT

"Não é só na boca do caixa que o PT se degrada. Sob nova direção, o partido aprovou em reunião neste fim de semana um documento camarada nas autocríticas, mas enfático quando aponta "estratégias oportunistas da direita" para "abreviar o mandato popular, legal e legítimo, do presidente Lula".Ao mesmo tempo, o PT aceitou os termos da carta em que Delúbio Soares pede afastamento por tempo indeterminado da legenda, não sem antes deixar de mencionar seu "compromisso com o povo brasileiro" e concluir com "saudações petistas". A resolução do PT e a carta de Delúbio são uma impostura e um escárnio.De um lado, o aparato petista premia o ex-tesoureiro, retirando-o de cena sem puni-lo; de outro, faz coro à tese do golpismo, reavivada dias antes pelo próprio presidente, como se ele fosse vítima, quando na verdade está sendo poupado pela benevolência cínica e pelo cálculo do establishment -e o PT sabe disso.Homem de Lula, Tarso Genro atua pela blindagem e faz o jogo do conchavo interno, mas posa de novo guardião da ética, camuflando sua real missão por meio da fala empolada de bacharel. O partido segue podre, refém da chantagem dos que sabem os segredos do "mensalão".O fato é que Lula e os picaretas do PT não têm mais o que dizer ao país. O presidente não se dá nem ao menos o trabalho de explicar o dinheiro que emprestou do partido. Se desconhece quem saldou a dívida, Delúbio deve saber. Inclusive porque o crupiê do PT -aquele que pagava e recolhia as apostas-, antes de ser da "turma do Zé", pertence, desde a sua origem no partido, à "turma do Lula".A famosa foto de novembro de 2003, com Delúbio flagrado de cócoras atrás da mesa, segurando a cigarrilha que o presidente fumava às escondidas, ilustra tanto a proximidade como o tipo de relação que entre eles se estabeleceu. Também nesta imagem premonitória ele exercia as funções do leva-e-traz -o empregado de luxo, aquele cuja ascensão pessoal e na hierarquia do esquema está ligada à fidelidade cega que dedicou ao chefão. Hoje suas "saudações petistas" soam como código da máfia."

08 agosto 2005

Presidente Jatobá

Artigo de Clóvis Rossi, na Folha de S. Paulo da última sexta-feira.
Não é inimputável

"O presidente Luiz Inácio Lula da Silva comporta-se como se fosse inimputável. Não é. Sua história de vida, sua origem pobre, a educação que diz ter recebido dos pais, o cargo que ocupa -nada disso o faz melhor do que qualquer outro cidadão brasileiro.
Por isso, teria que dar o exemplo quando fala de pedir desculpas a quem é injustamente acusado. Lula, para ficar só no mais folclórico dos exemplos, disse que havia "300 picaretas" no Congresso Nacional, sem oferecer a mais leve prova. Pediu desculpas? Não. Ao contrário, ao chegar ao governo, juntou-se a eles, o que, aliás, é uma das origens de seus problemas atuais.
Presidente da República, mais que qualquer outro, deve explicações ao público. Deve, por exemplo, explicar a estranha associação entre seu filho e a Telemar, até para que fique claro que soube dar aos filhos a educação que diz ter recebido dos pais.
Deve, por exemplo, enfrentar sua responsabilidade na "tragédia" de seu partido, o PT ("tragédia" é expressão de José Dirceu, que se considera emblemático do partido).Lula foi um dos criadores do partido, foi seu presidente ("por apenas três anos", foge agora), é seu símbolo, foi seu único candidato presidencial em todas as quatro eleições havidas desde a fundação do PT. Não pode, portanto, se considerar inimputável pelos "erros" cometidos por seus dirigentes (expressão também dele próprio, de Dirceu e do novo presidente petista, Tarso Genro).
Não dá para se considerar inimputável quando a quase totalidade dos envolvidos com a dinheirama de Marcos Valério é do PT e da base aliada de seu governo.Por fim, cabe lembrar que o "vão ter que me engolir", além de muito abaixo da dignidade do cargo, é de mau agouro. Quem o inventou foi o técnico Zagallo, em 1997. Acabou engolido em 1998 (por Zidane e cia.) e por Felipão na Copa seguinte."

05 agosto 2005

Sobre livros

Para os admiradores daquela coisinha tão indigesta a muitos - cultura -, há uma bela novidade: é a revista EntreLivros, que neste mês chega a sua 4ª edição. É realmente fantástica, daquelas revistas de ler inteira, sem pular nenhuma página. Traz sempre um Dossiê sobre algum assunto ligado à literatura (neste mês, melhor impossível, trata dos grandes autores russos - Tolstoi, Dostoievski e Tchekhov), reportagens (há uma sobre uma confraria dos bibliófilos - sensacional -, e até reportagem sobre os "ex-libris", aqueles selos personalidados para marcar a propriedade de livros), colunas, a seção "O livro do mês", um Caderno de Resenhas, com resenhas sobre diversos livros, bem como diversas outras seções que qualquer admirador de uma boa leitura fica embasbacado.
Enfim, uma revista realmente fantástica, imperdível, algo até inesperado para um país dito tão inculto quanto o Brasil. Espero apenas que tenha vida longa. Ah, o site, pra quem tiver interesse em uma prévia antes de comprar na banca: http://www.revistaentrelivros.com.br/.
Também ouvi dizer que, aos domingos, às 21h30, há um programa na TV Cultura, sobre literatura, mas ainda não assisti. Fica também a dica!

Artigo - Cristovam Buarque

A espera e a doação

Graças à sua biografia e à história do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva teve a rara chance de ser o presidente capaz de pedir aos ricos que doassem e aos pobres que esperassem. Sua credibilidade entre a população pobre lhe dava o direito de pedir paciência nas mudanças. E a força com que chegou lhe permitia cobrar dos ricos que aceitassem as mudanças.
Mas a chance foi perdida. Aos pobres, a oferta foi de administrar melhor e de forma assistencial os programas antigos; aos ricos, de manter os privilégios intactos. Foi uma chance perdida, sobretudo pela história do Brasil. Dificilmente teremos um momento histórico mais favorável e um presidente mais habilitado para promover um encontro de diversas classes para construir a Nação.
Lamentavelmente, um fator impediu que isso acontecesse: Lula e o PT nunca explicitaram um projeto de Nação. Partido e líder se formaram a partir de uma visão corporativa que divide o país em pedaços, a serem atendidos separadamente. Nunca perceberam que a Nação é um ente diferente de uma soma de suas partes, e que nos momentos de crise é preciso reorientar o destino nacional com um projeto transformador. Essa é a diferença entre a Bolsa-Escola e a Bolsa Família. A primeira ajuda a reorientar o destino nacional pela educação, a outra ajuda no presente as famílias que a recebem.
Além de não perceberem a necessidade de um projeto para reorientar o futuro do País, o PT e o governo foram corrompidos pelas facilidades do marketing na manipulação da opinião pública. E acreditaram que, no governo, isso funcionaria durante quatro anos. E depois mais por mais quatro, até eleger o sucessor.
Não podia dar certo, e assim alertaram várias pessoas, diversas vezes, algumas do próprio governo, mas fora do núcleo central. Os escândalos de corrupção são parte de um jogo de política superficial, retratam a arrogância do publicitário que passa a acreditar na veracidade da publicidade que faz.
O pior é que toda vez que surgiram problemas, causados pelo descompasso entre realidade e imagem, chamaram o marqueteiro para ajustar a imagem, em vez de mudarem a realidade de erros e omissões do governo.
Até que ficou tarde. O político Lula pode até continuar popular, ser reeleito e bem-sucedido até o final de um segundo mandato, perpetuando a omissão, evitando a mudança. Mas acabou o líder que poderia mudar o Brasil, capaz de fazer o País obedecer sem usar nenhum autoritarismo, e de reorientar o nosso destino. Ele abandonou a espera e a doação. Preferiu a encenação à transformação, ficar na esquina que herdou, em vez de nos conduzir no caminho da mudança, como todos esperavam.
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Cristovam Buarque é professor da Universidade de Brasília e Senador pelo PT/DF
cristovam@senador.gov.br / http://www.cristovam.com.br/

03 agosto 2005

Livro da Semana: A Revolução dos Bichos

Nestes tempos de crise da esquerda, sinto-me obrigado a indicar esta obra-prima de Gerge Orwell. Ele é o mesmo autor do clássico 1984, que criou a idéia do Grande Irmão (Big Brother), aquele que tudo vê e controla, como um modelo de sociedade totalitária. Como se vê, este brilhante e consagrado autor é avesso a totalitarismos e autoritarismos, como todos deveriam ser (há uns e outros que maculam seus verdadeiros ideais em torno de uma suposta democracia socialista, que até hoje só sobreviveu de forma ditatorial...). Bem, mas vamos ao livro. Mais uma vez opto por indicar um livro pequeno (96 páginas). É talvez a prova de que livro não precisa ser grande para ser bom.
Orwell conta a história dos animais de uma fazenda, que percebem a vida indigna a que são submetidos: são explorados pelos homens, em troca de um salário (ops, ração) miserável. Liderados pelos porcos, criam uma revolução, expulsando os fazendeiros da propriedade e criando um Estado no qual os bichos seriam todos iguais, pondo fim então à exploração do bicho pelo homem.
Todavia, com o tempo, o grupo dos porcos - os idealizadores desta Revolução - começam a se tornar "superiores" aos demais bichos; proclamam-se dirigentes da revolução, invocam-se determinados privilégios (em nome da preservação do ideal revolucionário e igualitário), e promovem, por fim, a exploração do bicho pelo bicho!
Quem já percebeu a semelhança com o socialismo não está enganado! Esta obra, publicada em 1945, foi logo interpretada como uma sátira sobre os descaminhos da Revolução Russa (quando os bolcheviques tomam o poder e fuzilam a família do Czar). Ela faz de fato uma dura crítica ao totalitarismo soviético, e aplica-se em qualquer grau às demais experiências socialistas que o mundo já presenciou: ao longo da obra, a informação e o acesso a ela é sempre manipulado e controlado (alguém aí pensou em Fidel Castro?); frases ditas ontem são desmentidas hoje (Partido dos Trabalhadores, no Brasil?).
Enfim, é uma mostra do fracasso da idéia socialista, ilustrada magistralmente no parágrafo final, no qual os porcos começam a se comportar como homens (aqueles mesmos, que eles haviam expulsado, e aos quais diziam nutrir aversão), chegando mesmo a se reunir com eles para beber e jogar (alguem pensou agora em Josés Dirceus e Lulas tomando Romanée Conti e usando MontBlanc, símbolos máximos do capitalismo que até ontem eles odiavam?):
"Doze vozes gritavam, cheias de ódio, e eram todas iguais. Não havia dúvida, agora, quanto ao que sucedera à fisionomia dos porcos. As criaturas de fora olhavam de um porco para um homem, de um homem para um porco e de um porco para um homem outra vez; mas já era impossível distinguir quem era homem, quem era porco".

Jefferson x Dirceu

Comentário da cientista política Lucia Hippolito na CBN:

"Pelo visto, nunca, na história deste país, houve um chefe de Casa Civil tão desinformado como o ex-ministro José Dirceu. Não sabia de nada, não viu nada, negou tudo, desmentiu tudo. Tão inocente, mas tão inocente, que não sabia por que o deputado Roberto Jefferson o acusa de mentor do mensalão, de chefe de uma camarilha bolchevique que teria tomado de assalto o Estado brasileiro.
Em suma, o mais esperado confronto da política brasileira nas últimas décadas aconteceu em clima tenso, com acusações de mentiroso de lado a lado.
Mas Roberto Jefferson foi um pouco mais convincente. Não porque diga a verdade o tempo todo, mas principalmente porque tem estado no centro do palco há quase dois meses, apresentando uma denúncia atrás da outra, e a maioria confirmada pelas investigações.
E José Dirceu, que passou semanas se preparando para comparecer ao Conselho de Ética, não teve o desempenho que se esperava. Exagerou tanto no novo papel que, ao declarar que nunca foi arrogante, arrancou gargalhadas de toda a audiência.
O confronto entre Dirceu e Jefferson foi o ponto alto do dia. Mas depois, o depoimento murchou e ficou anticlimático. Sucederam-se deputados, perguntas e respostas, mas o melhor da festa já tinha acontecido. Aguardamos os próximos capítulos."

02 agosto 2005

Adeus às armas

Editorial da Folha de São Paulo de hoje:

A MUDANÇA DO IRA

"A decisão do IRA (Exército Republicano Irlandês) de depor armas colocando fim a 35 anos de atividades terroristas, num conflito que remonta ao século 17, prova que é possível encontrar soluções políticas mesmo para embates cujas origens se perdem no tempo e que encerram componentes religiosos. O IRA, católico, lutava contra a presença britânica na Irlanda do Norte, da qual 60% são protestantes e não querem que o país deixe de fazer parte do Reino Unido. Em sua campanha pela unificação da Irlanda do Norte com a República da Irlanda (país independente, de maioria católica), o IRA assassinou cerca de 1.800 pessoas em diversos ataques.A renúncia às armas, que ainda precisa ser seguida de gestos concretos, se inscreve num processo político que teve início nos anos 90, mas que experimentou várias idas e vindas. Entre os fatores que parecem ter contribuído para a solução destacam-se, além da disposição de todas as partes para negociar seriamente, a consolidação da democracia na Irlanda no âmbito da União Européia e sua pujança econômica. Com efeito, os irlandeses da República, que antes davam apoio moral e financeiro ao IRA, deixaram de fazê-lo e, em muitos casos, passaram a contestar os meios utilizados pela organização. O prestígio do IRA também vinha sofrendo abalos entre seus simpatizantes mais ferrenhos, pois havia claros indícios de que o grupo estava, a exemplo de organizações políticas da América Latina, se desviando para o banditismo comum. Por fim, parece correto afirmar que, em algum sentido, o velho terrorismo ocidental foi desbancado pelo novo terrorismo "jihadista" da rede Al Qaeda. Na velha forma, as ações eram pautas por uma lógica política, totalmente distorcida, mas ainda assim lógica. Na nova modalidade, a meta política - refundar o Califado - mal se distingue de aspirações teológicas. É como se o terrorismo se tivesse tornado um fim em si mesmo. O próprio terrorista se sacrifica como homem-bomba. As ações visam a ser o mais espetaculares - leia-se mortíferas - possível. Nem os radicais do IRA querem correr o risco de ser confundidos com essa gente."
..................
P.S. O momento histórico, com a deposição das armas do IRA, vem ao encontro do título deste blog (seria profecia?), "emprestado" da grande obra de Ernest Hemingway; também o texto de abertura deste site é extraído da obra de Hemingway (Adeus às armas).
P.S.2. O assunto do presente post foi sugestão do grande amigo e intelectual Victor Knewitz, uma daquelas pessoas com as quais dá gosto conversar sobre tudo!

Quanto e para quem - Valerioduto


* Sócia do publicitário Duda Mendonça
** Irmão do ex-presidente do PT José Genoino
*** Tesoureiro informal do PTB
**** Presidente do PTB que morreu em acidente aéreo
***** Secretário-executivo do ministro Ciro Gomes (Integração Nacional)

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E parece que não tem fim...

É impressionante a ausência de luz no fim do túnel... Quando se acha que agora vai dar uma acalmada, surgem mais fatos (sim, fatos, e não "tentativas conservadoras de desestabilizar o governo", porque não somos idiotas como o PT gostaria que fôssemos). E a mais alta prova de que todo o esquema denunciado por Roberto Jefferson era verdade é o festival de renúncias que já começou, e que tem tudo para continuar. Ou alguém acredita que a renúncia não é claramente a confissão de culpa?

De Leonardo Souza na Folha de S. Paulo, hoje:

"Cinco deputados petistas ligados ao escândalo do "mensalão" podem anunciar renúncia coletiva a seus mandatos nos próximos dias, segundo a Folha apurou. João Paulo Cunha (SP), Professor Luizinho (SP), Paulo Rocha (PA), Josias Gomes (BA) e João Magno (MG) reúnem-se hoje com líderes e integrantes da Executiva Nacional do PT para decidir seu futuro.
Todos eles receberam direta ou indiretamente dinheiro das empresas do publicitário mineiro Marcos Valério, de acordo com investigações da CPI dos Correios. A decisão do deputado Valdemar Costa Neto (PL-SP) reforçou a idéia da renúncia coletiva.
O gesto dos petistas contribuiria para preservar a imagem do partido, fortemente desgastada nos últimos meses. Ontem, eles negaram a intenção de renunciar.
Hoje são pelo menos 20 deputados federais ligados ao esquema do "mensalão". Se não renunciarem, poderão ser cassados por quebra de decoro, perdendo os direitos políticos e tornando-se inelegíveis até 2015. Assim, não poderiam se candidatar em 2006."
E então? A culpa está assumida. Resta ao povo se indignar, como se indignou por bem menos com Collor.