05 dezembro 2005


Comentário da cientista política Lucia Hippolito na CBN:

" Entre 7 de setembro e 4 de novembro de 1940, a aviação alemã despejou várias toneladas de bombas sobre Londres, numa das mais violentas batalhas da Segunda Guerra Mundial.
Durante o que ficou conhecido como a Batalha da Inglaterra, foram 57 noites de puro horror. A população da capital inglesa viveu esses dias inteiramente aterrorizada, dormindo em abrigos e voltando no dia seguinte, para encontrar, no lugar onde tinha sido sua casa, um monte de escombros.
A destruição atingiu até mesmo uma ala do Palácio de Buckingham, residência da família real. O rei George VI foi vivamente aconselhado a deixar Londres com sua mulher e suas duas filhas, uma das quais é a atual rainha Elizabeth II.Se a família real se mudasse para o interior da Inglaterra, suas chances de sobreviver às bombas nazistas seriam infinitamente maiores.
Nessa hora, ao contrário do que era aconselhado, a rainha ergueu-se como um monumento. Baixinha, gordinha, sem nenhuma importância até ali, a mulher de George VI transformou-se numa leoa, na solidariedade ao seu povo.
Não só declarou que ninguém de sua família deixaria a cidade de Londres, como passou a visitar diariamente bairros bombardeados para mostrar que a família real continuava ali, ao lado de seu povo, mesmo na mais tenebrosa adversidade.
Com isso, a rainha conquistou para sempre a admiração e o amor dos ingleses. Veio a morrer em 2002, com 101 anos, cercada pela devoção do seu povo.
Naqueles dias de 1940, a família real inglesa demonstrou uma absoluta lealdade à sua gente. A população de Londres não foi abandonada. Na mais dura prova até então vivida por uma grande cidade, os londrinos tiveram ao seu lado o seu rei, sua rainha e seu governo.
A primeira família, seja na realeza ou na República, é sempre simbólica. Ela é uma transmissora de valores, de adesão às marcas nacionais. Seus atos apontam caminhos, soluções e possibilidades. O exemplo que ela dá revela seu compromisso com o país e seu futuro.
Tudo isso me vem à lembrança quando leio nos jornais que no Brasil a esposa do presidente da República solicitou e conseguiu de um governo estrangeiro cidadania para ela, seus filhos e seus netos.
A mulher do presidente Lula, seus filhos e netos são hoje também cidadãos italianos. O que será que isto quer dizer?
Como esta atitude será interpretada pela maioria dos brasileiros, que não querem fugir do país e que tentam, todo santo dia, fazer do Brasil um país melhor?
Como o Brasil espera inspirar confiança nos investidores estrangeiros, quando a família do presidente da República já conseguiu para si mesma uma rota de fuga do país?"
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P.S.1. Também tenho direito a solicitar cidadania italiana. Todavia, como pretendo seguir carreira diplomática, acho um tanto quanto sem nexo decidir representar meu país, tendo cidadania de outro. Se quero ser um representante legítimo e fiel de minha pátria, minha ligação deve ser tão somente com ela. Por isso, em que pese alguns familiares já estarem requerendo o passaporte italiano, decidi por enquanto não solicitar o meu. Infelizmente, no Brasil de hoje quem dá exemplo somos nós, e não o governo (acho que nos Brasis de ontem também era assim, né... mas ao menos tínhamos governantes dos quais poderíamos esperar alguma atitude coerente. Não é o caso do atual governo)
P.S.2. O amigo Marcelo Ahrends leu e sugere o livro recém lançado da cientísta política Lucia Hippolito (Por dentro do governo Lula), no qual ela faz um apanhado de todos seus comentários realizados na CBN e que traçam a cronologia da crise do atual governo, com a visão do dia-a-dia de uma grande crítica e analista de nosso país. Vale a pena!!